quinta-feira, 31 de julho de 2014

CACURI,UMA OBRA DE ARTE DO MEU INTERIOR.




Quem vê uma cacuri pela primeira vez, não imagina as diversas fases em que o Caboclo tem de superar até concluir sua obra. Normalmente, quando se decide a fazer um cacuri, o local onde será “sentado”  já está previamente escolhido ou, pelo menos, já  se tem em mente. Após tomar a decisão, o Caboclo deve dispor das talas de jupati ou de algumas toiças da mesma árvore para que as folhas sejam cortadas, tiradas as talas e postas para secar. Deverá ter guardado ou encomendado o cipó, sendo que o cipó pode ser o titíca, mais durável quando em contato com a água e mais forte, por essas características mais difícil de ser encontrado ou o tracuá, mais inferior, às vezes, ainda encontrado nos inajazeiros nas capoeiras. Tendo o material disponível, começa a tecer os paris, que normalmente serão de três alturas, sendo os da espia;da primeira roda, mais altos do que os da espia e os da segunda roda, estes, mais altos do que os dois anteriores. Observe na foto. 
O peixe, subindo ou descendo o rio, baterá na espia e se der sorte e rumar para a beirada poderá fugir, mas se for para o meio do rio, seguirá a espia, passará pela primeira roda e finalmente entrará na segundo roda que é menor do que a primeira e com uma entrada/saída bem pequena, que fica amarrada. O peixe forçará para entrar e não conseguirá sair. O peixe quando depara-se com  um obstáculo tende a forçar a passagem e ir em frente.
 Se olharmos um cacuri de perto, veremos que é uma armadilha muito bem imaginada, para mim uma verdadeira obra de arte.
Após os paris ficarem prontos, são cortadas as estacas, da mesma forma, não são exatamente iguais, as que ficam mais fora, isto é, mais afastadas da margem do rio, são mais altas e uma delas é bem forte e alta, a principal, para segurar com firmeza e esticar os paris da segunda roda. Observe na foto.
Para “sentar” o cacuri, vai-se com a maré seca e estaca-se. Depois “espalha-se” os paris, deixando as estacas de um lado e de outra do pari, isto é, vai-se trançando. Esse serviço, nem sempre se consegue terminar numa maré, porque aos poucos a maré vai crescendo e às vezes, volta-se depois para terminar o serviço.
Concluído a passagem dos paris pelas estacas, vem o acabamento, isto é, a fixação do pari no chão e as amarrações dos paris nas estacas e nas emendas entre um e outro. Concluída essa fase e estando tudo perfeito, o Caboclo irá dar o acabamento final, fazendo a Pindapeua, que é uma tapagem existente entre a margem do rio a o primeiro pari da espia, pois dificilmente o pari encosta perfeitamente na margem, ficando sempre uma possível passagem para os peixes e, para evitar a passagem do peixe, coloca-se a Pindapeua.
Feito isso,inspecionado o cacuri, tudo em perfeitas condições, é só esperar as alternâncias das marés. Geralmente despesca-se uma vez por dia e sempre na maré seca, a menos que algum peixe ou outro fato indique uma necessidade de despescar com a maré cheia. Quando vai-se despescar o cacuri, é aconselhavél levar uma zagaia para verificar a existência de alguma arraia. Feita a inspeção e constatando-se inexistência de perigo, despesca-se o cacuri com um paneiro, às vezes, mergulha-se com o paneiro, vindo desde o solo, pegando-se os peixes existentes.
Esse é um tipo de pesca que  os poucos está caindo em desuso, primeiro pela facilidade de comprar-se peixes nos mercados e segundo, os peixes que normalmente se pega nos cacuris, estão ficando cada vez mais  vasqueiros, contudo, quem perde mesmo é a cultura do meu interior, que aos poucos está desaparecendo e chegará um dia que, os cacuris, serão só lembranças.   



domingo, 27 de julho de 2014

O AÇAÍ É NOSSO. SERÁ?

  • Conterrâneo , me tire umas dúvidas. Você há de imaginar: lá vem esse camarada com dúvida! Não me leve a mal, mas tenho minhas limitações. Primeiro, nasci no sítio, lá no Giticateu e dizem que esse pessoal tem certas limitações. Segundo, e até mesmo pela cultura adquirida na minha Tapera, comi muita polpa de caroço de tucumã, o que pode ter contribuído para que eu custe aprender ou entender. Dito isto vamos lá: não sei se você chegou a ver ou ouvir o ranger do cabo do pique ou da boca, mesmo dos amantilhos das igarités que saiam do trapiche de Ponta de Pedras, até bater de açaí. Essas igarités atracavam no Beco do Cano e no dia seguinte descarregavam o açaí ali na escadinha, junto do "Mosqueiro/Soure", hoje transformado em Estação das Docas. Vi inúmeras vezes nossa maior riqueza ser jogada na Baia do Guajará  porque não tinha comprador, quando bamburrava então....O tempo passou, a população mundial aumentou, países cresceram, as doenças apareceram e novos remédios foram descobertos. Dentre as enfermidades, as causadas ao coração mereceram muita atenção e para controlar tantos problemas cardíacos, surgiram as estatinas, que enriqueceram vários laboratórios, face seu grande consumo. Para evitar o aparecimento precoce de doenças cardíacas, foi aconselhado mais exercícios, as academias proliferam e mais ainda, foi anunciado o grande poder do resverastrol, encontrado em abundância na uva. Tomando um copinho de vinho por dia, o coração agradece! Hoje, sabemos que o nosso velho açaí é rico em resveratrol e uma excelente fonte de energia.  O açaí, hoje, além de conhecido é muito consumido, principalmente por esportistas. Dado a esse consumo, é  facilmente encontrado nos grandes supermercados e vindo dos mais diversos locais do País, às vezes, de locais que eu nem sabia que produzia açaí. Ainda um dia desses, entrei numa casa que vende produtos Nordestinos (fui comprar minha farinha) e deparei com uma placa: TEMOS AÇAÍ. Solicitei um litro e imediatamente verifiquei a procedência, vá que tivesse vindo da China, porque hoje, o que mais tem é produto chinês. Não era....era do Amapá! Aí eu pensei: mas o Amapá não produz Manganês? Mas era do Amapá, pelo menos a embalagem, e o vendedor garantiu ser de excelente qualidade. Pavulage.... eu disse para ele: Cuidado, eu conheço açaí bom, sou de Ponta de Pedras! Ele olhou um pouco admirado e eu disse: É no Marajó... ai paguei e fui embora. O resultado não foi lá muito satisfatório, pois joguei o açaí fora, era mais "fino" do que açaí paró. Lembrei do açaí paró de Ponta de Pedras, "fino", mas gostoso. Aquele grosso, do meu tempo do Giticateu, que era amassado no alguidar e passado na peneira de arumã, só lembrança, aliás, jamais encontrei qualquer embalagem com açaí produzido em Ponta de Pedras.
  • Conterrâneo, você que está sempre perto desta gente, responda para mim: se o açaí é nosso, se temos açaí de excelente qualidade e grande quantidade, se Ponta de Pedras fica perto de Belém, temos água doce em abundância, o Marajó-Açu está ai e não me deixa mentir, energia suficiente para ligar algumas maquinas para bater açaí, então por que não produzimos um litrinho de açaí para exportar para fora do nosso Município. Agora mesmo veja um anúncio oferecendo açaí, sei lá de onde, mas de Ponta de Pedras, necas de pitibiriba. Ai eu pergunto: mas o AÇAÍ É MESMO NOSSO? Tenho minhas dúvidas.