As guaribas faziam a
festa lá longe, enquanto Juca do Panga, de cócoras numa raiz de mututizeiro,
caniço na mão, pescava alguns matupiris no poção, que ficava logo abaixo do
porto, onde o miritizeiro, preso pelos marás ia lá fora. Ao seu lado um caniço
feito de jiniporana fincado no tijuco, mantinha n’água uma linha mais grossa
com uma anzol bem estrovado, vai que um peixe purrudo estivesse mariscando por
ali! Nunca se sabe. A maré estava pra repontar e aproximava-se a hora dos
peixes começarem a bater.
Seu Belarmino, sentado
na beira do jirau, limpava umas talas de jupati pra fazer funil para uns
matapís que tecera e como ainda tinha um resto de coco com farinha pra fazer as
poquecas, precisava terminar aqueles matapís para espalhar pelo igarapé, mesmo
sabendo que camarão estava vasqueiro.
Dona Fuluca, cuia na
mão, não parava de chamar os xerimbabos para contagem e assim verificar se o
gavião ou sucuriju não devorou um pinto ou um patinho. Pretinha, a bacurota,
fuçava no coroçal, levantando uma imissidade de mucuim.
No fogão, a panela
tisnada guardava só um caldo de peixe que sobrara do almoço; na lata de farinha
só restava cuí, impróprio para um bom chibé, talvez desse pra fazer um caribé
ou, quando muito, um mingau pateta. No pasto, o açaí ainda estava paró. A boca
da noite se aproximava e a janta não estava garantida.
- Peguei!
Era o Juca anunciando
que fisgara um peixe no anzol maior.
- O que já é antão
piqueno? – disse D.Fuluca.
- É um tebeira de um
jacundá-piranga, disse Juca.
Após um tempo de luta,
o jacundá foi dominado e levado para cima de uma ponta de tijuco que ficava
próximo, assustando os sararás que mariscavam por ali.
- Cuidado com o
istrepe nu pé e num me perde o pexe porque huje parece que o jucuraru passu
pelo fugão! Recomendou D. Fuluca.
O peixe foi pro
paneiro de jacitara que Juca levara com as iscas, a janta estava garantida.
Juca se dirigiu pra
casa e entregou o peixe pra D. Fuluca que foi em direção ao jirau para preparar,
enquanto Juca, pegou o machado para tirar algumas achas de lenha para preparar
o fogo para fazer o moqueado.
Seu Belarmino terminara
de iscar os matapís e se preparava para sair,
porém, antes, pegou o remo, a poronga pois a noite não tardaria e um terçado
que estava enfiado na palha e foi espalhar os matapís.
- Belarmino, num
demora porque logo, logo o pexe está muqueado e cumer pexe frio num é bom – alertou
D. Fuluca.
Seu Belarmino saiu.
Juca e D. Fuluca
ficaram cuidando do moquém e aprontando o peixe, sem pressa, para esperar seu
Belarmino que não tardou muito, pois eram só cinco matapís.
Seu Belarmino já
chegou banhado, pois aproveitou para dar um mergulho no porto e, por causa
disso, levou uma pequena descompustura de D Fuluca:
- Mas Belarmino, num
me diz que tu tumaste banho no porto uma hora destas? - Sim, dei um mergulho.
– Mas tu num sabes que
a Mãe D’Água se incomoda cum barulho esta hora e pode te fazer argum mar? É, mas Ela sabe da minha
necessidade, me perdoa. Respondeu seu Belarmino.
Juca, que estava na
ilharga do moquém avisou: - Tá pronto!
- Antão vamos cumer,
disse D. Fuluca, que pegou os pratos que estavam num petisqueiro juntamente com
as colheres e espalhou no assoalho. Juca botou o peixe num xarão e levou para o
meio da mesa posta e seu Belarmino, dirigiu-se para a lata para pegar a
farinha. Mas quando meteu a cuia e viu que só tinha cuí, disse: -Mas acabou a
farinha? D. Fuluca respondeu: - Acabu, só tem isti cuí.
Juca lembrou do ditado
que diz: em casa de pobre, quando tem carne falta farinha. No que D. Fuluca
retrucou: - Mas piqueno, te dê por abençoado, quantas bucas num tão querendo uma
bucada de cumer e não têm! Nós que temos, devemos agradecer a Deus e vamu cumer
assim mesmo e depois procurar a rede.