sexta-feira, 10 de junho de 2011

PIRAQUEIRAR

A noite estava chegando, Juca estava cuíra, andando de um lado para outro. Dona Fuluca, sentada nos tornozelos, na ilharga de um esteio, amassava na mão o tabaco migado e de vez em quando olhava para o Juca que não parava. Não aguentando mais perguntou.
- O que já é antão piqueno, argum bicho te ferru?
-Não, Mamãe, eu estou pensando em dar uma volta por aí, pra piraqueirar, ver se mato algum aracu, um tucunaré, quem sabe? Parece que hoje promete. Respondeu juca.
- Passa daí virafolha, tu me joga essa bagana nu tijucu e eu te du umas bordoadas, agora essa cachorra só vive inrrudilhada. D.Fuluca afastou a cadela e argumentou.
- Mas quando antão, ainda trezontonti o cumpadre Belarmino disse que tem ido piraqueirar e não tem incontrado nada. Também, esta gente num dexa u pexe se criar, estão pegando pexe muito gito, gitito mesmo. Camarão antão, só aviú i umas catirinas qui num serve pra tapar um buraco de dente. Disque pula argum aruanã, mas eu hem..num gosto de cumer aquele pexe, disque é filho de sapo. Isconjuro!
- É, mas o seu Belarmino não deve saber onde os aracus estão, quando vou iscar os matapis, vejo que naquele poço, ali abaixo do mangueiro, tem batido uns peixes, parecem graúdos, purrudos mesmo, quem sabe? Respondeu Juca.
- Antão cuida inquanto é cedo e vê se não vorta tarde. Tira logo a tua janta, tá na panela de barro inrriba da trempe. Farinha tem puco, só iste cuí que tá na lata, a farinha dos Abaeteuaras não era bua. Nós temos inté qui tirar uns dias pra fazer uma farinha, com esse haver de chuva a mandioca ainda vai apudrecê, senão, o caititu acaba.Disse D. Fuluca.
- Quando eu voltar eu janto, não vou demorar.
Juca pegou a zagaia, o arpão e retirou da palha um terçado que, pelo cabo, dava pra notar os longos anos de uso. O cabo era de madeira fixado com parafuso e para firmar bem, era todo enrrolado com fio de cobre bem fino, retirado de enrolamento de motor que Juca conseguiu em Ponta de Pedras. Era um Collins 128, terçado do bom, comprado na Casa Forol, em Belém, ideal para a piraqueira . Juca ainda pegou a poronga, lanterna, fósforo, um paneiro de arumã, dois pares de pilhas, remo e calmamente dirigiu-se para o porto para pegar o casco.
- Juca, posso ir contigo? Perguntou Diquinha, irmã do Juca.
- Não, piraqueirar precisa de silêncio,se tu fores vais ficar igual a cabrita, pulando no casco, pode virar. Quando eu for lanternar tu vais, tá bom? Respondeu Juca.
- Diquinha retirou-se um pouco amuada e arremedando Juca.
- Mas axí…..te aquieta piquena, dexa de assanhamento ralhou D. fuluca. Acende logo essa lamparina e vê si incontra meo cachimbo, o velho, porque u nuvo num presta, esbandalhu - completou. Juca saiu.
 A medida que ia iluminando as margens com a lanterna, via alguns camarões, um peixinho aqui, um barulhinho ali, passou por um aningal,mas peixe grande nada. Assustou-se com o voo de um arapapá. Quando estava passando perto de um açacuzeiro, notou um barulho numas folhas, então pensou: deve ser alguma mucura, mas eu não trouxe a espingarda senão estava já no chão. Continuou.
Depois de algum tempo, ao passar perto de uma pitaiqueira tombada em cima do igarapé, num aturiazal abatumado pelos galhos,viu um tucunaré e como estava relativamente fundo, pegou o arpão e jogou. Pelo movimento da linha presa no arpão tinha acertado. Após algum tempo, com o peixe já cansado e junto ao casco, notou que tratava-se de um bom tucunaré, Juca calculou mais ou menos tres quilos. Ficou satisfeito.
Ainda matou alguns peixes menores que estavam dormindo embaixo das galhadas das árvores, contudo, era o suficiente e voltou para casa. Ao encostar o casco, D. Fuluca logo perguntou.
- Mas já? Tu num fuste piraqueirar, fuste é buscar fugo na casa da cumadre Dicota.
- Não, Mamãe, eu arpoei um tucunaré tebeira, acho que é o suficiente, pode ser que seu Belarmino esteja por aí e se tiver mais, ele pega.
_ É meo filho, pega só u da boia, pra que isplorar o garapé? A Mãe do garapé num gosta. Disse D.Fuluca.
Juca amarrou o casco, pegou o material, botou os peixes no paneiro e quando D. Fuluca viu, disse:
- Benza Deus meo filho e parece qui tá gordo, vamu cume muqueado com açaí amanhã.   
- Eu quero a cabeça, disse Diquinha que estava entretida.
- Mas te aquieta piquena, assopra loga ixe fogu que eu vu fazer um caribé cum o cuí de farinha i vê se num te tisna na trempe. Disse D. Fuluca.
Após Juca voltar do porto, ter tomado banho e agazalhado o casco D. Fuluca botou o jantar e enquanto juca tomava o caldo do jandiá, sem farinha, ouviu o sino da igreja badalar, no que D. Fuluca comentou.
- É u padre chamando pra ladainha, mas nessa lonjura, quando qui dá pra ir. Mas a gente reza na hora de dormir, ouviram ispiqueno.   

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