Num finalzinho de tarde de verão, Juca do Panga
resolveu esticar um espinhel para ver se conseguia pegar algum peixe;um
filhote, surubim,dourada, piramutaba ou qualquer outro, pois já fazia algum
tempo que não saboreava um caldo de peixe fresco com pimenta. Sabia que peixes
grandes por aquelas bandas já andavam vasqueiros, peixe de cacuri, tapagem ou
de lanço ainda tinha uma boa rebarba. O espinhel já estava pronto e pendurado
no beiral da casa fazia algum tempo, anzóis estorvados tipo peito de camarão,
mussum na gamela pronto para servir de isca; pedra que serviria de poita junto
ao primeiro mará do porto, tudo pronto, maré de lançante. A linha, que Juca
tingiu com cumaté, fora comprada em Belém pelo seu Seruaia, marreteiro conhecido
que fazia algumas compras quando ia a Belém, aproveitava para vender alguns
xerimbabos da D.Fuluca e trazer alguma encomenda. Ganhava uma “beirinha” é
claro, pois, aumentava o preço da mercadoria que constava da nota fiscal, essa não era entregue a quem encomendou o objeto, sempre com a desculpa de que não
recebera a nota. O Espinhel precisava ser testado, senão podia ficar panema!
Juca do Panga, em pé junto a um espeque que
escorava um pé de manga caiana, aguardava o café que D.Fuluca preparava no
fogão, estava demorando porque a lenha que seu Felismino conseguira estava
verduenga. Seu Felismino, sentado na beira do jirau, uma das pernas encolhida também
aguardava o café enquanto apreciava uma bácula que deliciava-se num lamaçal no
pé de um inajazeiro velho. Diquinha, com um pitó no cabelo, procurava por uma
suvela para costurar um chinela de sola que usava para pisar no tijuco quando
ia para o terreiro dar milho aos xarimbabos.
- Mas credo em cruz Filismino, essas axas de ingá
istão verde, tu não pudias percurar pelo menos mututi seco aí pelo mato? Disse
D. Fuluca.
Bão…tú pensa qui tá fácil achar lenha boa por aí,
esse pessoar tira tudo, umas zinha assim,assim, só lá pra cabeceira do mucambo,
fora disso, só essas verduengas mesmo, qui jeito? Respondeu seu Filismino.
- Mas está bom Mamãe, é só esperar mais um pouco
que pega fogo, aí o café sai. Interveio Juca.
- Mas bão, agora quem aguenta uma fumaça dessas, é
porque num é nu zolho de vuces; mas me diz uma cuisa: tu vai demorar pra por iste
ispinhé? Comentou D. Fuluca.
-Não Mamãe, eu volto logo porque ainda quero ir no
Itaguary para dar uma olhada na Pirapema que sai hoje, quero ver o Manduca
jogar uns versos, estou só esperando a maré parar mais um pouco porque quero
por o espinhel na preamar. Respondeu Juca.
- Oh cobôco bom num verso o Manduca, benza Deus! Disse seu Filismino.
- Oh cobôco bom num verso o Manduca, benza Deus! Disse seu Filismino.
- Mas me diz uma cuisa: donde antão tu já vai botar
iste espinher? Indagou D. Fuluca.
-Estou pensando em colocar ali abaixo da casa da
tia Tila, naquele aningal.
Hum, hum concordou D. Fuluca.
Meo filho, coloca a montaria direito naquela
samaumeira grande do utro lado, tu sabe qui naquela direção tem um puço, se o espinher ficar
pra baxo fica inrriba da ponta du baxio da ilha e si ficar pra cima pode
engatar nas pedras, onde a Dinoca se esbandalhu, tu te alembra? Recomendou seu
Filismino.
-É, eu sei Papai.
- I qui oras tu tá pensando ir pro Itaguary antão?
Quis saber D. Fuluca.
- Depois da ladainha, quando soltarem os foguetes
acho que já estou voltando, se Deus quizer. Respondeu Juca.
-Toma o café meo filho, toma meo Veio. Diquinha,
mea filha, vai percurar café na chicolatera e si quizeres rosca tem dentro da
lata de mulico que istá inrriba da tábua, na ilharga du pote, pega lá. Disse
D.Fuluca.
- Já vou Mamãe, a senhora sabe onde está a suvela?
Perguntou Diquinha.
- Dexa me alembrar…hum, já sei! Percura nixi balaio
de arumã aí perto da lamparina, mas num me disarruma ixis cueros qui tu
perparando pro filho da cumadre Ismaelina, si num istiver, istá dentro dixe
barde de cuia dipindurado na ilharga du oratório. Respondeu D. Fuluca.
Juca tomou o café, juntou o material dentro de um
paneiro de jacitara e rumou para o porto para embarcar na montaria. Seu
Filismino permaneceu sentado observando o filho que se afastava remando igarapé
abaixo.
Chegando no aningal, local escolhido, maré na
preamar, juca selecionou uma aningueira forte, amarrou a montaria; um anu
coroca voou e pousou num galho de mangueiro ali perto; alguns tralhotos que estavam nadando por ali saltaram assustados e algumas ciganas que estavam pousadas nos galhos de uma momoraneira voaram; na outra margem do rio via-se
um bando de garças voando rente a água em direção ao poleiro para passar a
noite e as luzes do Itaguary aos poucos começavam a piscar, a noite estava chegando. Juca cortou os muçuns e pacientemente iscou o espinhel, pendurando os
anzóis na falca da montaria, para que na medida em que fosse remando para fora,
se afastando da margem, os anzóis fossem cainda n’água. Ao terminar de iscar o
espinhel desceu n’água com uma das pontas da linha e mergulhando, amarrou na
aningueira, lá no fundo, para que o espinhel não aparecesse quando a maré
estivesse baixa. Subiu na montaria e começou a remar em direção a samaumeira,
conforme orientação do Pai.
Após ter posto todos anzóis n’água, remou bem forte
para esticar o espinhel e largou a pedra que estava amarrada na outra ponta da
linha. Quando regressava para casa, ao se aproximar do porto,
ouviu o estouro de um foguete, era o anúncio de que a ladainha não demoraria
muito a começar, mas a Pirapema só ia sair lá pelas nove, dava tempo.
Obs: Caso tenha dúvida com alguma palavra usado no sítio, consulte o vocabilário do sítio existente no blog.
Obs: Caso tenha dúvida com alguma palavra usado no sítio, consulte o vocabilário do sítio existente no blog.
Nenhum comentário:
Postar um comentário