domingo, 3 de março de 2019

LEMBRANÇAS DO MEU INTERIOR: AS DUAS ORQUESTRAS.


Sinquidia, após o almoço, tirei a minha pestana e quando acordei, liguei a TV. Estava sendo apresentada uma orquestra com vários instrumentos. Tinha violinos, clarinetes, saxofones, pratos, tuba e outros instrumentos, todos distribuídos segundo seus naipes. Na frente da orquestra, um senhor aparentando já ter vivido alguns anos, comandava. Com a batuta na mão, ao movimentá-la numa direção, determinados instrumentos eram acentuados, se noutra direção, sobressaiam outros instrumentos, se levantava os dois braços ouvia-se os instrumentos ao mesmo tempo e no final, lentamente, o maestro ia abaixando os braços, com movimentos suaves e os músicos iam diminuindo o som dos seus instrumentos até o maestro fazer um movimento com a batuta e sinalizar, para os músicos, o final da música. Uma cortina ia se fechando à medida que os aplausos irrompiam na plateia. Houve um breve silêncio até iniciar outra música. Exatamente durante o silêncio eu lembrei do meu interior.
Quando ainda gito, também após o almoço, geralmente aquele bom açaí com camarão frito ou peixe assado, era costume tirarmos a nossa pestana e ai daquele que fizesse alguma zoada! Minha Mãe só dava um hum!!!!!!!!!!..Era o sinal para fazer silêncio total. Quando acordávamos, ouvíamos alguns chincoãs, eventualmente algum gavião com fome ou araçarís, até o tucano, do alto de um árvore, anunciar que era hora dos músicos da orquestra do meu interior se reunirem. Aos poucos, como na orquestra da capital, os músicos começam se apresentar, era o curió e o tem-tem na mangueira, as pipiras nas goiabeiras, o rouxinol na copa do meritizeiro, o inambu com o seu grave na capoeira e eventualmente.ouvia-se os periquitos e papagaios na comedia. Na medida que ia entardecendo, a cigarra entrava com o seu solo e logo depois ouvia-se a saracura lá pro igarapé, era sinal que a noite estava chegando. Nessas horas, como se o maestro levantasse as duas mãos, as garças se alvoraçavam no aturiazal, as guaribas faziam um alarido como um coro, o socó-boi dava aquele grave lá pra cabeceira da baixa e as ciganas, ao pularem nos galhos das momoranas era como os pratos da orquestra da TV. Mais tarde, já escuro, o arapapá iniciava a sua apresentação, seguido pelas corujas que anunciavam a proximidade do fim do espetáculo. Em casa, após a reza antes de dormir e as bençãos de Pai, Mãe e irmão mais velho, começávamos adormecer, mas ainda podia-se ouvir o barulho das folhas do açaizeiro mexendo, como se fossem aplausos, eram as mucuras que estavam saindo para mariscar, mas pra nós, a cortina ia se fechando e caíamos naquele sono profundo até o dia amanhecer. Final do espetáculo! O enxerido, pra não perder o seu enxerimento, pode perguntar: - Mas faltou o maestro da tua orquestra do teu interior! Eu digo para os enxeridos que não faltou nada, o maestro estava presente e comandando tudo, pois o Maestro da Orquestra do meu Interior é DEUS.

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