sábado, 16 de julho de 2016

O MEU INTERIOR ONTEM.

Quando ainda pequeno, a luz elétrica em Ponta de Pedras era desligada às onze da noite, dava uma piscada antes. Lembro que o café nas igarités era servido numa canequinha esmaltada. Para o pessoal da "diretoria", às vezes, vinha num charão contendo algumas decorações. Eventualmente, acompanhava o café, umas roscas compradas no Zé Leite, na Casa da Beira. O fogão da igarité era feito numa lata que servira para armazenar querosene e depois de lavada, era cheia até a metade com barro, para servir de local para se fazer o fogo. Em dois lados da lata faziam dois furos, por onde passavam dois ferros para apoiar a panela de feijão com pirarucu ou a chicolateira para ferver a borra para fazer o café. Era comum ver o Nalziro ali pela ilharga do trapiche; o Malva ou o seu Ademar fazendo um carreto; o Lizaldo comprando um pouco de mantimento "só pra intera" ; o Pedro Serra ou o Cuiapéua, marreteiros profissionais, carregando paneiros com camarões fritos ou paneiros com patos ou outro xerimbabo para vender em Belém. No mercado, camarão bamburrava e sempre tínhamos peixe fresco.
Durante as festividades na Cidade, as moças ponta-pedrenses que moravam em Belém, compareciam e juntas com suas amigas e parentas que moravam no Município, encantavam os rapazes que, parados ao lado das calçadas, apreciavam as moças passearem na calçada da pracinha, geralmente no sentido contrário ao ponteiro dos relógios, eram moças bonitas e vaidosas que conversando e sorrindo, eram um colírio para a rapaziada, valia a pena apreciar. No coreto, a banda da PM tocava os seus dobrados e na última noite, o seu Ioiô, como leiloeiro, circulava entre as pessoas perguntando quem dava mais pelo objeto tal. Finalizando a festividade, soltavam o tradicional balão ali de perto do coreto e todos olhavam para cima para apreciar e talvez pensar: onde cairá?
Basicamente existiam três grupos de rapazes e moças: os que eram de Ponta de Pedras e moravam em Belém; os que moravam na Cidade e o pessoal do sítio, eu fazia parte do último grupo. Geralmente nas reuniões que eram realizadas ali na parte superior do King Bar, participavam mais os grupos dos residentes em Belém e os da Cidade, o pessoal do sítio se reunia mais ali pro Carnapijó, onde dançávamos até de madrugada, isto se não tivesse ordem para acabar com a festa mais cedo. Dependendo do horário do término das festas, um café no Emérito ou um pão quentinho do Doca, era uma boa pedida, antes de empreendermos nosso retorno para o sitio. Naquela época, não era uma tarefa fácil um rapaz do interior namorar uma moça da Cidade ou pelo menos "flertar" com uma moça de Belém, alguns até conseguiram, mas como se costuma dizer: conta-se nos dedos.
Nessa época eu já morava em Belém e quando visitava o meu interior, ia para o sitio e aproveitava o tempo para acompanhar o meu Pai nos seus afazeres diários. Participei de inúmeras tarefas, mas o que eu gostava mesmo era acompanhar o "velho" nas pescarias. Ao cair da tarde,quando saíamos para iscar os matapis, a beirada ficava cheia de pescadores, era gente esticando espinhéis; uns pondo matapis; outros preparando as estacas para sentar a camboa; alguns despescando os seus cacuris; tinha gente pescando com linha de mão; a beirada era movimentada e daí a grande quantidade de camarão que aparecia no mercado. Não era uma época fácil, tínhamos carência de vários itens, como socorro médico numa urgência, mas por não dispormos, conseguíamos conviver e sobreviver, mesmo com dificuldades, mas eu lembro bem: éramos felizes.

Pracinha de Ponta de Pedras, onde noutros tempos as pessoas se reuniam para passear durante as festividades de Nossa Senhora da 
Conceição, hoje é impossível, a praça foi ocupada por vendedores.

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