segunda-feira, 15 de agosto de 2011

PATO COZIDO.



Juca do Panga estava para Belém e chegou num sábado, lá pelas seis da tarde, soube que ia ter uma festa no Cupicháua. Por coincidência, encontrou na ponte do João Ramos dois amigos, Chico Mulato e Diquito Prego que estavam se preparando para irem à festa, o convidaram. Chico Mulato era forte e pelo apelido deduz-se suas características; Diquito Prego tinha esse pseudônimo devido às traquinagens que aprontava sempre que estava num ajuntamento. Juca aceitou o convite.
Foi em casa rapidamente tomou benção dos pais e rumou em direção à ponte,não podia  perder a passagem.
Durante a viagem a reclamação era somente a fome, pois não tínham jantado nada.
Chegaram na festa, amarraram a montaria no mará e saltaram.Na casa, estavam em preparativos para o início da ladainha. Juca e Chico ficaram no terraço e Diquito Prego resolveu guardar os remos. Nesse ínterim teve início a ladainha e nada do Diquito.
Juca e Chico entraram na casa e ficaram na sala para acompanharem a ladainha, é bem verdade que os dois eram aru em ladainha, só rezavam quando o coro dizia: ora pro nobis ou amém!
Depois de vários ora pro nobis e améns, Juca olhou para trás e viu Diquito, que deu uma piscadela. Juca pensou com seus botões:
- Esse malandro já arranjou uma pequena!
Quando terminou a ladainha, ainda nos améns, os três se reuniram e Diquito pegando os dois pelos braços disse:
- Venham cá, vamos jantar.
 Os três saíram e seguiram por umas estivas de açaizeiros que pelo forte odor que pairava no ar,parecia ser o rumo da retrete. Depois de estarem relativamente longe da casa e do “ar perfumado”, desceram das estivas e de uma toiça de açaí Diquito Prego tirou uma panela com bastante comida. Embatucados, Juca e Chico perguntaram como ele conseguira aquela boia, Diquito respondeu:
- Comam antes que nos descubram.
 Devoraram tudo, a fome era negra. O “quitute”  era pato cozido.   
Depois limparam as mão nas folhas e posteriormente foram ao porto, onde completaram a limpeza e passaram extrato, quem disse que ficou algum vestígio?
Empanzinados, não entraram logo na casa, ficaram sentados numas montarias que estavam em terra, as pessoas chegaram cedo e puxaram suas embarcações.Os três ficaram lá aguardando o picarpe dar início aos merengues, boleros,forrós e mazurcas.
Quando estavam bem fazendo a digestão do pato, ouviram aquele furdunço lá pra dentro e curiosos foram só abicorar, qual foi a surpresa deles: a dona da casa avexada e fula da vida saracoteava pela sala esconjurando alguém porque, enquanto ela rezava, algum patife, sem-vergonha, tinha roubada uma panela de pato cozido que estava pendurada num caibro da cozinha.
Diquito Prego, parado na porta da casa, mão no queixo dizia:
 - Mas coinfeito é muita coragem comerem o pato da D. Maroca, são uns desalmados, é muito abuso.
Seu Quirino, do alto dos seus setenta anos mais ou menos, empambado e rosto enjilhado, da ilharga de um paneiro de bacaba, camisa aberta até o umbigo e pernas das calças enrroladas, uma até o joelho e outra logo acima do tornozelo – pé tuíra de tijuco – tirando a bagana da boca disse com ar zangado:
- Se eu pego esse porqueira, seguro pelo gogó, dou-lhe umas bordoadas no cangote e depois  jogo n’água.
 Mais tranquila, D. Maroca disse:
Mas se ele pensa que vai deixar meus convidados com fome, axi, eu ainda tenha um capado pronto dentro de um alguidar, esperem que daqui a pouco eu sirvo a bóia. Claro foi só para os convidados, os três não estavam incluídos, ela fora bem claro.Convidados.
A festa foi ótima, dançaram a noite inteira. No botequim, sardinha na lata, carne em conserva,cerveja cerpa, guarasuco, licor de genipapo ou os pires de arroz doce da D.Santinha, tudo em temperatura ambiente porque não tinha geladeira, estavam sempre à disposição dos interessados.
 Pela manhã, alguns coçados ainda comentavam o acontecido,as mais velhas diziam: “disque foi u buto”.As mais novas que ouviram: “credo em cruz”.E banziam-se.
Não sei se acharam a panela.

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